
REDE NACIONAL DE
PROMOTORAS LEGAIS POPULARES

CARTA DE PRINCÍPIOS
REDE NACIONAL DE PROMOTORAS LEGAIS POPULARES

INTRODUÇÃO
Desde 1980 que projetos de formação de mulheres em direitos Introdução têm ocorrido de forma mais sistemática na América Latina. Nesse contexto, em maio de 1992, ocorreu no Brasil um seminário sobre os direitos das mulheres promovido pelo Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher (CLADEM). Integrantes da União de Mulheres do Município de São Paulo e da organização THEMIS - Gênero e Justiça, do Rio Grande do Sul, participaram desse seminário e foi lá que conheceram projetos de capacitação legal de mulheres. A partir disso, esses dois movimentos, União de Mulheres e THEMIS, articularam-se para implantar a capacitação legal de mulheres no Brasil. Com isso, nasceu em terras brasileiras o projeto de Promotoras Legais Populares (PLP).
A primeira turma de PLP foi formada na cidade de Porto Alegre em 1993, coordenada pela THEMIS. No ano seguinte, a União de Mulheres de São Paulo, apoiada pela THEMIS e pelo Centro de Estudos da Procuradoria do Estado de São Paulo, organizou o Seminário Introdução ao Curso de Promotoras Legais Populares, que contou com a participação de professoras(es) vinculadas(os) ao Centro de Estudos, 35 lideranças de entidades feministas e sindicatos e de mulheres das diversas regiões do país. A partir disso, o projeto de Promotoras Legais Populares, inicialmente proposto e executado pela Themis e, posteriormente implantado na cidade de São Paulo, aconteceu continuamente até o ano de 2020, quando precisou ser interrompido momentaneamente devido à pandemia. Ao longo desses anos, desde a implementação das Promotoras Legais Populares no Brasil até hoje, os cursos de formação continuam se expandindo pelo país, graças ao apoio de diversos movimentos sociais, militantes, organizações feministas e profissionais de áreas diversas.
Com o movimento de Promotoras Legais Populares, procuramos construir uma educação popular feminista em direitos, com centralidade em gênero, raça/etnia e classe social, para que as mulheres, em suas múltiplas identidades políticas, possam tanto conhecê-los quanto se apropriar deles, visto que historicamente seus direitos são atacados, deslegitimados ou não reconhecidos pela sociedade patriarcal, o que as coloca numa posição de marginalização, que pode ser agravada por seu lugar étnico-racial, sua classe social, sua sexualidade e qualquer outro lugar fora da normatividade.
Por meio das formações de Promotoras Legais Populares, buscamos construir uma articulação política que lute contra a desigualdade de gênero e pela defesa dos direitos das mulheres e pela efetivação do acesso à justiça. Nesse sentido, um marco histórico importante dentro desse contexto foi a luta pela Constituinte e pela democracia em um momento em que ainda vivíamos os resquícios de uma sociedade autoritária e antidemocrática recém saída da ditadura militar (1964-1985). Após muita luta realizada por diversos movimentos sociais para a inclusão das demandas das mulheres na nova Constituição Federal, conseguimos coletivamente que a igualdade entre homens e mulheres vigorasse no texto constitucional, porém ela ainda hoje nem sempre é efetivada, pois ainda vemos diferentes formas de discriminação e violência às quais as mulheres estão sujeitas. A partir disso, entra o movimento de Promotoras Legais Populares que busca a efetivação dessas demandas só possível com movimento, resistência e enfrentamento a uma sociedade racista, machista e capitalista, visando assim uma transformação não apenas das mulheres individualmente, mas sobretudo uma transformação radical coletiva.

PREÂMBULO
01
As Promotoras Legais Populares (PLPs) são um movimento social criado e articulado desde 1994 por entidades e coletivos a partir da educação popularfeminista em direitos, com centralidade de gênero, raça/etnia e classe social;
02
A Rede Nacional de Promotoras Legais Populares é um movimento de mulheres para articulação política nacional feminista, se organizando de forma popular na luta por direitos sociais e direitos humanos das mulheres, respeitando a autonomia e as especificidades de cada região, em defesa das lutas de combate ao racismo e à intolerância religiosa, em defesa do Estado laico, contra o capitalismo, pelos direitos das pessoas com deficiência, das populações indígenas e povos tradicionais, da população LGBTQI+, da população idosa, das crianças e adolescentes.
03
A rede é um instrumento de organização das lutas sociais e direitos humanos das mulheres, bem como um espaço de comunicação, interação e troca de experiências entre os coletivos, como forma de colaboração para o fortalecimento do movimento de PLPs.
04
A Rede Nacional se configura como um movimento social feminista e popular de articulação de coletivos de PLPs, dotados de autonomia em suas formas de atuação, mas que mantêm unidade quanto aos princípios e objetivos elencados nessa carta.
05
Essa carta é fruto do debate entre representantes de coletivos de PLPs de todo o país que se reuniram no período de 21 de junho a 19 de setembro de 2020, debatendo os sentidos e rumos do movimento de PLPs visando a construção da Rede Nacional.

PRINCÍPIOS
01
Feminismo é um movimento político, ideológico, pelo fim da opressão e subordinação histórica das mulheres, comprometido com as lutas anti patriarcais, anti racistas, anti capitalistas, anti coloniais, anti-lgbtfóbicas, com vistas à eliminação de todas as formas de opressão contra as mulheres e o respeito à natureza e a democracia.
02
Reconhecer os diversos feminismos, desde que tenham como princípio básico a centralidade de gênero, raça e classe, ou seja, respeitando as diversas formas de ser mulher e compreendendo a interseccionalidade – enquanto termo afrocêntrico – destas categorias como fator que situa as mulheres negras como grupo mais impactado.
03
Educação popular feminista como um projeto de transformação social que compreende a construção coletiva e horizontal de saberes relacionados aos direitos das mulheres no combate ao racismo e as desigualdades sociais.
04
A rede nacional de PLPs assume o compromisso de atuar em defesa dos
direitos e políticas públicas que eliminem as discriminações e todas as violências contra as mulheres, incluindo a defesa e o fortalecimento de ações afirmativas e outras políticas públicas de promoção da igualdade e equidade que fomentem os direitos das mulheres.
05
A defesa de todos os direitos das mulheres, esses entendidos como fruto de
articulação dos movimentos feministas pela destituição de todas as formas de
opressão contra as mulheres, estando ou não reconhecidos em lei.
06
O compromisso de enfrentar todas as desigualdades de classe, raça, etnia,
orientação sexual, identidade de gênero, geracional e de pessoas com
deficiência.
07
A defesa do meio ambiente que afeta fortemente as mulheres, em especial, as
mulheres periféricas, camponesas, de povos indígenas, dos povos quilombolas, e dos demais povos de comunidades tradicionais.
08
Todas as mulheres que assim se identificarem serão compreendidas e
respeitadas como mulheres, independente de sua identidade de gênero ou
orientação sexual.
09
Mulheres negras e mulheres periféricas devem ter sua participação garantida e
priorizada de escolha.
10
A atuação política da Rede de PLPs se dá com base na autonomia partidária, a
partir de seus princípios e seus posicionamentos de esquerda, com independência organizativa e financeira quanto a candidaturas, gestões governamentais e entidades privadas.
11
Em ações nacionais construídas pela rede podemos fazer parcerias pontuais desde que aliadas aos nossos princípios fundamentais.
12
Em relação às ações nacionais construídas pela rede, podem ser feitas parcerias pontuais com instituições que respeitem nossos princípios.
13
A rede atua em respeito a autonomia dos coletivos, que se organizam de acordo com as realidades locais, desde que suas atuações estejam em consonância com os princípios gerais da rede.

OBJETIVOS
01
Criar um ambiente de troca de experiências e de orientação dos cursos de formação de promotoras legais populares em todo Brasil, com fundamento nos princípios firmados nesta Carta
02
Apoiar e auxiliar as ações do movimento de PLPs, respeitando a pluralidade das coordenações estaduais, regionais, municipais, locais e territoriais
03
Construir e efetivar a pauta e agenda nacional comum, campanhas, calendários com datas importantes para o movimento político de mobilização; denúncia de violências e avanço de políticas públicas
04
Articular e dialogar com demais movimentos feministas alinhados com os princípios da Rede, em especial com movimentos de mulheres negras, de mulheres indígenas e de trabalhadoras domésticas
05
Desenvolver estratégias e compartilhar materiais como ferramentas para o fomento e a continuidade do movimento
06
Articular de forma solidária as atuações políticas das PLPs, bem como pela demanda por políticas públicas para a promoção de direitos para as mulheres, com observação das atuações territoriais
07
Fortalecer e dar visibilidade as PLPs como movimento nacional, estadual, regional e local
08
Alinhar politicamente o movimento nacional de PLPs, orientado pelos princípios
apresentados nesta Carta
09
Promover formações conjuntas para fortalecer a base comum de compreensão política do movimento de PLPs e impulsionar a atualização de temáticas relevantes
10
Auxiliar a construção de movimentos de PLPs em localidades onde ainda não há
coletivos, por meio da formação de formadoras

ESTRUTURA
01
A organização da Rede será pautada pela horizontalidade nas tomadas de decisão, com a participação igualitária de todas PLPs
02
Nas atividades da Rede, na medida do possível, atentar para a necessidade de acessibilidade para todas as mulheres com deficiência
03
Nas atividades da Rede, na medida do possível, garantir a participação de todas, buscando superar empecilhos econômicos
04
Uma coordenação geral composta por um coletivo de Promotoras Legais Populares de cada estado, sendo indicado pela coordenação estadual, se houver, garantindo a rotatividade anual e a representatividade das mulheres negras
05
A indicação da representante do coletivo deve se pautar pelo respeito à autonomia local
06
As tarefas da coordenação geral envolvem manter o contato atualizado das participantes; promover encontros, registros da vida organizativa da rede; fortalecer a articulação nos estados; organizar e promover o calendário de atividades da Rede; organizar os grupos de trabalho; falar em nome da rede após a consulta aos coletivos de PLPs; dar visibilidade à rede, dentre outras atividades definidas conjuntamente pelos coletivos de PLPs
07
A Rede poderá ser composta por Grupos de Trabalho de acordo com a necessidade do cotidiano de suas atividades
08
Haverá um espaço informal de consulta aos coletivos de PLPs para pautas urgentes e que não gerem conflitos, além disso, haverá reuniões com representantes de todos os coletivos de PLPs para trocas e deliberações, de forma periódica e de acordo com a necessidade da conjuntura
09
Encontro nacional de PLPs com periodicidade mínima de um ano, podendo ser virtual, e presencialmente a cada 2 anos
10
As decisões no âmbito da Rede sempre deverão se pautar na busca pelo consenso, não sendo alcançado, excepcionalmente, será feita votação por maioria simples. O que não for decidido por consenso na Coordenação Geral será objeto de discussão em reuniões com representantes de todos os coletivos de PLPs